CPI fura-fila na Assembleia ameaça projetos e o futuro de Zema
Com o secretário fura-fila (Carlos Amaral, da Saúde) demitido, a crise foi parar no colo do governador Romeu Zema (Novo). Qual seja, a de que 828 pessoas (veja lista dos nomes abaixo) teriam furado a fila da vacinação na Secretaria de Saúde. A denúncia provocou abertura de CPI na Assembleia Legislativa, na quinta (11), para investigar a suposta irregularidade. No mesmo dia, Zema demitiu o secretário titular. Chegou a hora de o governador entrar em campo e virar o articulador do próprio governo. Pode não saber, mas sabe que tem poder para isso. Até porque, Zema nunca deu importância à relação com a Assembleia Legislativa.
Zema discursa, observado pelo agora ex-secretário de Saúde Carlos Amaral, foto Pedro Gontijo/ImprensaMG
Para ele, seu governo e o Partido Novo, era apenas uma questão de princípio, de reconhecer ou não, de valorizar, ou não, o papel do outro Poder de Estado. Avaliavam como algo ultrapassado, da velha política tentando sobreviver. Agora, o quadro mudou e virou questão de sobrevivência política do próprio Zema. Outra consequência, seus projetos prioritários irão perder ambiente para prosseguir sem essa contaminação paralela.
Tentativa frustrada de abafar CPI
Emissários e aliados do governador passaram a quinta (11) ligando para deputados querendo saber se a demissão do secretário de Saúde abafaria a CPI e a crise. Em vão. Ao perceber o tamanho da crise, Zema deu uma guinada de 360 graus em menos de 24 horas.
Na manhã desse dia, disse que o secretário teria agido corretamente e que seria mantido no cargo. À noite, simplesmente o dispensou sem apresentar razões. Sequer usou o simplório “a pedidos”, como é quando o exonerado finge ter tido a iniciativa. Acabou indo por justa causa.
O jeito é criar, de rápido, o gabinete de crise para tratar de um problema que Zema e o Partido Novo nunca julgaram passar. O segundo ato do governo foi igualmente desastroso quando pisa o campo político. Enviou uma lista inautêntica, segundo o destinatário, o presidente da Assembleia Legislativa, Agostinho Patrus (PV), com os nomes dos que foram vacinados. Ele não só devolveu como mandou um recado curto e grosso: “Aguardo, com urgência, a lista correta”.
Agostinho reclamou falta de transparência; o documento enviado não era oficial, sem timbre da secretaria e o número de nomes foi inferior ao apresentado. O ato já era de governo e não se pode mais culpar o secretário demitido. Nova manifestação de desprezo para com o Legislativo mineiro.
Temperatura da crise subiu
Com a suspeita de que o documento poderia ser falso, a temperatura da crise subiu mais ainda, ganhando outra dimensão, ao juntar improbidade administrativa, com falsidade ideológica e outras suspeitas.
Será que o secretário de Governo, Igor Etto, responsável pela articulação política, vai segurar a pressão e se manter no cargo? Ficar ligando para deputados federais e pedir para que eles conversem com os estaduais, o que seria de sua responsabilidade, não parece ser uma boa estratégia política.
E mais, a capacidade de articulação não está em conversar com aliados, já que, sendo aliados, estariam, em tese, apoiando. Ao contrário, a expertise é conversar muito com a oposição e os independentes para convencê-los das boas intenções e propostas do governo. Caso contrário, a tendência é de a oposição crescer com a adesão dos independentes. Juntos formariam uma maioria perigosíssima para o próprio governador.
Limite da paciência
Tudo somado, a relação política de Zema com a Assembleia Legislativa, ainda que ele não tenha investido nela e dado pouco valor, chegou ao limite da paciência e de tolerância zero. Desde o início deste ano, consecutivos fatos vêm dando sinais de alerta, como a dificuldade de formação de bloco governista, que só tem 21 deputados.
O governo confiou nisso e no terceiro mês do ano levou uma CPI na cabeça. “A gente sabe como isso começa, mas não sabe como termina”, para repetir uma frase dita no meio quando surge um conflito dessa natureza.
A experiência tem que ser aprendida. O que derrubou o secretário da Saúde foram três fatos inaceitáveis. Claro, a primeira é a formação da lista dos fura-filas, entre eles o gabinete dele e ele próprio; para agravar esse absurdo, ele cometeu outros dois pecados capitais: falta de transparência e, terceiro, por esnobar a Assembleia.
Disse Amaral, na cara dos deputados e do presidente da Casa, que não iria liberar a lista dos privilegiados de sua pasta porque o caso estaria sob investigação sigilosa do Ministério Público (MP). Prometeu que iria consultar o jurídico dele para ver o que poderia fazer. Ou seja, demonstrou, ou reafirmou, o desprezo do governo para com o Legislativo. O MP pode; a Assembleia, que tem o dever e poder constitucional de investigar atos do governo, não.
CPI para mexer com os nervos
Sem articulação política, como já cansaram de observar, o governo, primeiro, não preparou o secretário para a sabatina com os deputados, como fizeram no 1º Assembleia Fiscaliza. Segundo, confiou que não iria dar em nada. Resultado, levou uma CPI com assinatura de 40 deputados, quando bastariam apenas 26.
O deputado Ulysses Gomes (PT) parabenizou o presidente da Assembleia pela atitude e afirmou estar orgulhoso por ser o primeiro signatário da CPI. “Ontem, cumprimos nosso papel de fiscalizar. Mas, infelizmente, o secretário não cumpriu o seu, ao não prestar contas sobre as graves denúncias de irregularidades que ocorrem na saúde”, disse.
De acordo com Ulysses Gomes, caberá à Assembleia dar um bom exemplo, fiscalizando a atuação irregular da Secretaria de Saúde. “Tenho certeza de que vamos a fundo para dar uma resposta a Minas Gerais, garantindo lisura e, sobretudo, vida ao nosso povo, que tanto sonha com a vacina”, acrescentou.
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