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Um adeus ao repórter Elizeu Lopes: "Qual é mesmo o lide, mestre?!"

Meu relacionamento com o saudoso repórter Elizeu Lopes começou na redação do extinto Diário de Minas, na Praça Raul Soares (Centro de BH). Eu cobria ‘cidades’, especificamente o surgimento da dengue em Minas. Após a apuração do dia, tinha que pegar meu filho mais velho (Tiago), então, com 5 anos, na escola antes que ela fechasse, e voltar correndo para o jornal e concluir a pauta do dia.

Entrei pela redação com aquele garoto sapeca e ordenei “fique aqui sentado e quietinho que preciso terminar a matéria para irmos embora”. Não adiantou e tinha que dar umas duras nele. Nisso, apareceu um sr. e disse assim “mas que menino bonito? é seu?”. Após confirmar, ele acrescentou “eu adoro crianças. Até o final do ano (estávamos em agosto) vou resolver minha situação”. O que você vai fazer?, perguntei. “Ah?! Vou casar com a Naiara (médica)”. Que legal, Elizeu, que bom!, incentivei.

A pedido do deputado Sávio Souza Cruz, Assembleia faz um minuto de silêncio em homenagem a Elizeu nessa terça (18), foto Guilherme Bergamini

O tempo passou. Voltamos a trabalhar juntos no Hoje em Dia, onde virei editor da política (de 1994 a 2010), ou chefe dele. Uma vez, ligou-me em casa para falar de alguma dificuldade e meu filho o atendeu. Ele foi logo perguntando “é o Tiago?”. Não, disse meu filho mais novo, “aqui é o Pedro”, que deveria ter uns 13 anos. Quando voltei ao jornal, Elizeu me contou o episódio. E comentou: “Você já está no segundo filho e já adolescente. Ah! eu tenho que resolver minha situação”. O que você vai fazer?, perguntei. "Vou casar até o final do ano”. Como já tinha ouvido aquela promessa, não botei fé. Nunca se casou, mas a doutora Naiara existiu sim: uma mulher bonita e elegante. Não sei por que não deu certo.

Dos quase 20 anos de contatos e trabalho, visitei-o uma única vez em sua casa na rua Rio Casca, no Carlos Prates.

O jornalista Márcio Metzker, Luiz Carlos Prestes e Elizeu Lopes, foto arquivo pessoal

“Qual é mesmo o lide, mestre!?”

Minha primeira experiência no jornalismo político foi com o repórter Elizeu. Depois de cobrir assuntos como aumento de preços e avanço da dengue, o então editor do Diário de Minas, Gilberto Menezes, me disse assim “você tem jeito para política. Vai cobrir lá na Assembleia junto com Elizeu (que era setorista lá)”. Chegando lá, Elizeu me recebeu muito bem e deu logo a primeira lição. “Não tem que ficar sentado na sala de imprensa”, onde ficavam mais de 10 jornalistas esperando a notícia procurá-los.

“Você tem que circular para fazer notícia. Vem comigo que vou te mostrar”, disse, enquanto dobrava a lauda (de maneira vertical) e dava um tapa nela para tensioná-la. Dividida em quatro colunas, escrevia em cada uma a matéria de sua apuração com uma indefectível bic azul. Nessa primeira lição, avistou um deputado a uns 300 metros e convocou “vamos dar uma carreira até lá”. Corremos e alcançamos o deputado federal Milton Reis (PMDB), que visitava a Assembleia. Foi logo me apresentando. “Esse é o nosso novo repórter, um jovem de talento”. O deputado me saudou.

Entrevista e matéria redigida em pé

Foi então que ele começou a entrevista, ali mesmo em pé, enquanto começava a escrever em sua lauda: “pois, então, o deputado federal Milton Reis declarou que...declarou o quê mesmo?”

O deputado limpava a garganta e iniciava o declaratório. Milton Reis, que deu aulas de português em Pouso Alegre antes de entrar na política, chegava a ditar suas respostas como um professor de Educação Moral e Cívica. “Somos contra a política econômica do presidente Sarney, vírgula, porque o governo desconsiderou a necessidade de ajustes, vírgula, não, desculpe, aí é ponto e vírgula”...

Pacientemente, Elizeu anotava tudo. Para minha surpresa, a entrevista seguiu assim até o final da lauda. Pronto, a matéria também estava redigida. Dessa forma, ele chegava à redação com oito matérias prontas. Era só passar para a máquina de escrever o que havia sido escrito à mão. O material que sobrava virava uma coluna de notas de nome ‘Notas Políticas”. Tudo somado, ele escrevia a página inteira, incluindo a coluna, uma tripa de notas.

"A gente tem que ser sério"

A partir daí, passei a dividir o espaço com ele. Com o carinho de um mestre, sempre repetia, “ninguém jamais ligou para reclamar de uma notícia que dei. A gente tem que ser sério”.

No período em que fomos repórteres, em veículos diferentes, ele tinha hábito, como todos fazíamos, de trocar figurinha após as entrevistas. Invariavelmente, ele perguntava ao coleguinha ao lado: “Qual é mesmo o lide, mestre?” Depois, seguia em paz para a redação final da matéria.

Um dia após seu aniversário, nessa terça (18), ele nos deixou. Obrigado, mestre Elizeu, por tudo que você fez por mim e pelo jornalismo e pelos seus exemplos. A missão foi concluída. Siga em sua trajetória de paz e de luz!

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